4/22/2015

A curiosa rotina do encantador de peixes

Foi no Sábado, o passeio do costume. Calcar as Ramblas até ao fundo, parar nos leões do Colombo, atravessar a estrada até à feira de velharias do Porto. Aí encontrou uma barbie, com cabelo feito rastas, que queria porque queria e eu, nas minhas filosofias de lhe ensinar que comprar tudo novo nem sempre é bom para o planeta... acedi. Três euros da minha vida por uma boneca que sabe deus, aquele cabelo... Foi a actividade do fim de dia de onte, amaciador às carradas e corte de cabelo novo. Depois falo sobre isso. A conversa de hoje é sobre outra coisa. Voltemos ao passeio.
Atravessamos a ponte do porto. Um dia cheio de sol e de turistas, e é tão bom já não sermos turistas nesta cidade. O mar ao lado. As gaivotas a cantar. Umas cinco crianças a rir alto, qual flautistas de Pan, como íman atraem mãe e filha. O motivo - centenas de peixes pretos, enormes, parecem botas a nadar. Amontoam-se ao lado da ponte. Cá em cima, a olhá-los com ares de Deus ou de domador, um velhote de cabelos compridos, todo ele sorrisos, todo ele palavras. Tinha 3 sacos cheios de baguettes. Ia partindo bocados de pão e atirava-os aos peixes, às crianças, aos pais, que nada faltasse para que todos se divertissem. E falava, falava... Como nos chamávamos, de onde éramos, se gostávamos de peixes, que é muito importante gostar dos peixes. E os ditos a comer, tudo a alimentá-los. Toma lá mais um bocado de pão. Explica-nos em catalão que vai às padarias dos paquistaneses onde lhe fazem as quatro baguetes por um euro, "os paquistaneses,  são uma maravilha para os negócios, uma pechincha, nada paga estas manhãs".
Gasta cinco euros e vem com 20 baguettes debaixo do braço - também podia trazer pão duro, que lho dariam de graça, mas não quer, que as crianças às vezes comem os troços que lhes dá e as crianças não podem comer mau pão. Vai ali há cinco anos. Todos os sábados, menos quando chove. No final, quando se acaba o pão, tem um prémio para todos, que tão bem o atirámos aos peixes. Que fechemos os olhos, um dois três - Sugos!!! Chegam mesmo à conta, parece que adivinhou.
E é assim que decide ocupar os sábados. A fazer os peixes e as pessoas felizes. Não houve ninguém que saísse dali sem lhe dar dois beijos e agradecer. Ele podia perfeitamente estar ali sozinho, a atirar o seu pão. Mas partilha, chama, conta, ri. Sabe que a vida, quando é partilhada, pode ser tão mais que mais-ou-menos. Lembrou-me o velho do adeus, ali no Saldanha. Esta cidade ensina-me todos os dias. É mais que um sítio onde se vive. É um estado de espírito.

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